«Mike Pompeo e Benjamin Netanyahu não são bem-vindos a Portugal» foi, mais do que o mote, o clamor que sobressaiu da acção pública realizada ao final da tarde de sexta-feira, 6 de Dezembro, no Largo Camões, espaço nobre da capital, já célebre pelas iniciativas em defesa da paz que regularmente ali têm lugar.
A visita do Secretário de Estado norte-americano e do ainda primeiro-ministro israelita fez convergir, na ação, diferentes críticas e causas: da oposição à guerra e ao militarismo à defesa do desarmamento e da dissolução da NATO; a solidariedade com os povos ameaçados e atacados pelo imperialismo norte-americano e o sionismo israelita; a rejeição do racismo e da xenofobia e a salvaguarda do meio ambiente e recursos naturais. De tudo isto e muito mais falaram os representantes de três organizações promotoras da ação – Filipe Ferreira, pelo CPPC; Jorge Cadima, pelo MPPM; e João Barreiros, pela CGTP-IN – e ainda o refugiado político colombiano Hector Mondragon.
Mas ali falou-se também de dignidade. A de um povo, o português, que há 45 anos se libertou do fascismo e se abriu solidariamente ao mundo. Que fez uma revolução profunda cujas principais conquistas estão plasmadas na Constituição da República Portuguesa, a Constituição de Abril, que em termos de política externa consagra princípios como a defesa da paz, a solução pacífica dos conflitos, o respeito pela soberania dos estados, o desarmamento, a dissolução dos blocos político-militares.
Precisamente o contrário, portanto, do que fizeram António Costa e Augusto Santos Silva ao «oferecerem» o território nacional para uma cimeira entre Pompeu e Netanyahu, onde se tratou do aprofundamento da ocupação da Palestina e de uma futura guerra contra o Irão. À memória veio imediatamente a vergonhosa cimeira das Lajes, em 2003, que preparou a agressão ao Iraque e pela qual o então primeiro-ministro Durão Barroso foi premiado com o cargo de presidente da Comissão Europeia e, depois, com um lugar na administração do banco Goldman Sachs. Mas também a corajosa afirmação de soberania que constituiu, em 1979, a realização no País de uma conferência mundial sobre o Médio Oriente e a Palestina, que trouxe a Portugal o líder histórico da resistência palestina, Yasser Arafat, recebido com honras de Estado pelo general Ramalho Eanes e Maria de Lurdes Pintassilgo, à data Presidente da República e Primeira-ministra, respetivamente.
A ação do Largo Camões serviu, também, para isto: para que o nome de Portugal não ficasse associado apenas à submissão e subserviência ao imperialismo, mas também à dignidade de um povo que está, e afirma-o, «do lado certo da história»: o da paz, da cooperação, da solidariedade com os povos.
Leia a intervenção do CPPC:
Boa tarde, companheiros,
Começo por saudar, em nome do Conselho Português para a Paz e Cooperação, as restantes organizações promotoras desta iniciativa, os artistas Tiago Santos e Sofia Lisboa – que nos brindaram com um belo momento de canção e luta – e, em particular, todos os que aqui fizeram questão de marcar presença, para afirmar bem alto que Michael Pompeo e Benjamin Netanyahu não são bem-vindos em Portugal!
Todos os que aqui estamos, e tantos que somos, mostramos também que o povo português, ao contrário do Governo, não é subserviente e submisso aos que são responsáveis por crimes de guerra, por agressões militares e golpes de Estado, por massacres e bloqueios, pelo agravamento da tensão internacional, a degradação ambiental e o desvio para armamento de astronómicas somas que resolveriam muitos dos mais graves problemas que afectam a Humanidade.
Não somos, ao contrário de António Costa e de Santos Silva, subservientes aos interesses da Administração de Trump, interesses contrários aos do povo português, interesses contrários aos interesses dos povos do mundo.
Mas estamos aqui, todos, a exigir a paz, o respeito pela liberdade e a soberania dos povos, pela democracia, para que se cumpra o direito internacional. Estamos aqui, em Lisboa, por nós, mas também pelos povos que resistem às guerras, às chantagens, às ameaças dos EUA e dos seus aliados. Na América Latina, no Médio Oriente, em África, na Ásia, em todo o mundo!
Michael Pompeo, é bom não esquecer, é um dos principais responsáveis da administração Trump e da sua política de escalada militarista e de confrontação que agride a soberania, a democracia e o direito internacional e arrasta o Mundo para grande perigos. Michael Pompeo representa os sectores mais reaccionários e belicistas instalados na administração norte-americana.
Estamos aqui em defesa da paz e do desarmamento, contra a NATO, essa estrutura belicista responsável por guerras e agressões que reduziram a escombros o que outrora foram países; que lidera a corrida a cada vez mais sofisticadas e destruidoras armas, com recurso a novas tecnologias como a inteligência artificial, que militariza o Cosmos e o ciberespaço; que cerca militarmente a Federação Russa e a China, identificando-os como seus adversários estratégicos, pondo em risco a paz e a segurança no mundo.
A NATO, e os EUA de Michael Pompeo, aumentam e modernizam o seu arsenal nuclear, assumem a possibilidade de usar este tipo de armamento num primeiro ataque inclusivamente contra países que não tenham estas armas e boicotam a entrada em vigor do Tratado de Proibição de Armas Nucleares, que lembremos ainda não foi assinado por Portugal, por, de acordo com Santos Silva, serem mais importantes os seus compromissos com a NATO.
Estamos aqui solidários com os povos do Médio Oriente – na Síria, no Iémene, no Iraque – que sofrem quotidianamente as consequências das agressões norte-americanas e o seu infindável rol de mortos, feridos, estropiados, órfãos e refugiados, de escolas e hospitais destruídos, de países reduzidos a escombros. Estamos aqui, também, a afirmar que não queremos guerra contra o Irão, como parece ser o desejo de Netanyahu, Pompeo e Trump.
Estamos aqui solidários com os povos da América Latina, que se batem pelo progresso e a justiça social, o que ali, mais do que noutros locais, implica o combate pela soberania contra a secular dominação norte-americana.
Lembremo-nos que foi esta administração, de que Pompeo faz parte, que ressuscitou clara e abertamente a Doutrina Monroe, com a qual os EUA se atribuem o domínio sobre as riquezas e recursos da América Latina.
Estamos aqui solidários com os povos de Cuba e da Venezuela, da Bolívia e da Colômbia, do Chile e do Brasil, da Nicarágua e do Haiti.
Repudiamos a subserviência e desrespeito pelo direito internacional de um Governo português que reconheceu a marioneta dos Estados Unidos da América para agredir a Venezuela, Guaidó, subserviência que Pompeo veio a Portugsl agradecer.
Estamos aqui solidários com todos os povos do mundo, e também com o povo dos Estados Unidos, contra o racismo e a xenofobia que são marca da administração de que Pompeo faz parte; estamos aqui a erguer a voz em defesa do direitos dos povos ao desenvolvimento soberano, a disporem dos seus recursos naturais, ameaçados pelas grandes empresas transnacionais e pelas grandes potências, com os EUA à cabeça.
Pode alguém assim ser bem-vindo no nosso País, no Portugal de Abril? Pode tão sinistra personalidade ser recebida com honras, sorrisos e afáveis apertos de mão pelos governantes de um país que, na sua Constituição – a Constituição de Abril –, preconiza a defesa da paz, da igualdade entre estados, o desarmamento e a dissolução dos blocos político-militares? Que rejeita o colonialismo, o imperialismo e qualquer outra forma de dominação de países e povos?
A resposta, é claramente Não!
Pouco depois de ser conhecida a vinda de Mike Pompeo ao nosso país ficou a saber-se que também Benjamin Netanyahu cá viria. E às múltiplas razões que já tínhamos para hoje nos reunirmos aqui somaram-se outras, ou não fosse Netanyahu um dos principais responsáveis pelo drama quotidiano do povo palestino: pelo cerco a Gaza e pelos massacres e recorrentes bombardeamentos à população palestina; pela construção de novos colonatos em Jerusalém Oriental e Cisjordânia e consequente expulsão das populações das suas casas e das suas terras; pela prisão de centenas de crianças.
Pode ser recebido em Portugal com honras quem assume a intenção de continuar e expandir a ocupação dos territórios da Palestina? Quem tem no seu currículo milhares de mortos, muitos dos quais crianças? Quem todos os dias desrespeita abertamente as resoluções das Nações Unidas? Aliás, o encontro de Pompeo e Netanyahu no nosso país é uma má notícia para o povo da Palestina, pois não podemos esquecer como a actual administração norte-americana reconheceu Jerusalém como capital de Israel e, há poucos dias, assumiu que os colonatos não são ilegais.
O encontro de Pompeo e Netanyahu no nosso país são seguramente uma má notícia para o povo do Irão, uma má notícia para os povos do Médio Oriente.
Não queremos que ninguém associe Portugal a esta imagem de subserviência e cumplicidade com o imperialismo norte-americano e o sionismo. Não em nosso nome!
Daí estarmos hoje aqui a dizer que os Netanyahus e os Pompeos deste mundo não são bem-vindos ao nosso país, que Portugal – o seu povo - está com os povos que sofrem e resistem e não com os seus carrascos, que o Portugal de Abril, solidário e amante da paz, está vivo!
E que continuaremos, lado a lado a nossa luta por um mundo onde não cabem nem os Pompeos, nem os Netanyahus nem os seus lacaios! Continuaremos lado a lado a luta por um mundo mais justo e fraterno. Por um mundo de Paz!
Viva a Paz!